O Ceifador: a humanidade que restou
Ter recebido O Ceifador, de Neal Shusterman, em parceria com a Companhia das Letras, depois de tanto tempo sem ler histórias distópicas, despertou em mim o fervor ávido pelas palavras em ação.
Título original: The scythe
Autor: Neal Shusterman
Editora: Seguinte (selo jovem da Companhia das Letras)
Ano: 2016 (EUA) | 2017 (BR)
Páginas: 442
★★★★★ + ❤
Eu não me animei de cara para ler o livro, mas ele me convenceu quando terminei de ler a sinopse. Na minha cabeça, a história se assemelhava bastante com Jogos Vorazes, porque em O Ceifador também temos dois protagonistas; uma menina e um menino. E, como na maioria das distopias, suas vidas se unem por causa do sistema social vigente. Nesta história, esse sistema social se afasta de tudo o que, de fato, conhecemos. A tecnologia é avançadíssima, o que permitiu que os humanos se tornassem imortais e que nada mais falhasse. Parece incrível que não haja mais guerras, mortes por doenças, suicídios e políticos ladrões. No entanto, com a vida infinita, foi preciso existir mecanismos de controle populacional. E é aqui que entra o caos: os ceifadores. Eles são entidades autorizadas a matar, de acordo com estatísticas da Era da Mortalidade e com as mais variadas armas.
Temer a morte, sendo mortal, é natural. No entanto, no livro, mesmo que exista a imortalidade, a morte também é uma noção conhecida. Mesmo que seja dito que a probabilidade de ser colhido seja muito baixa, fiquei o tempo inteiro imaginando como seria aguardar isso. São muitas as coisas que fazem esta distopia, que está apenas no volume I, ser incrível, a começar por esta dualidade entre vida e morte. A história me fez refletir muitas e muitas vezes sobre o suicídio, por exemplo, que é bastante mencionado. Nessa sociedade, ele raramente existe, uma vez que as pessoas são revivificadas quantas vezes puder. Aqui, todos são monitorados, mesmo que não pareça - o mundo é regido por uma "inteligência que tudo vê", a Nimbo-Cúmulo. Os ceifadores são os únicos seres que estão acima dessa inteligência e que agem independentes, de acordo com suas próprias regras.
"Não somos os mesmos seres que fomos no passado. Então, se não somos mais humanos, o que somos afinal?", p. 116 |
A história é contada pelos protagonistas Citra e Rowan, pessoas muito diferentes. Enquanto Citra tem uma família bem estruturada e de poder econômico bom, Rowan tem que lidar com inúmeros irmãos e saber que é invisível. As características pessoais de cada um deles me fez perceber que os papéis de gênero, exatamente como em Jogos Vorazes, não são estereotipados - o que me fez ficar muito feliz. Citra é a garota determinada, habilidosa e, por vezes, fria. Rowan é sensível, nem sempre sabe o que quer e dificilmente é contestador. Ao longo da narrativa, esses papéis se afastam e, em dado momento, se reforçam.
A trajetória de Citra e Rowan se encontra quando são escolhidos para serem aprendizes do ceifador Faraday. Ainda que nenhum deles tenha a real pretensão de exercer a função da colheita, aceitam serem treinados. Acontece que eles não tinham a mínima ideia no que estavam se metendo: o sistema é muito mais corruptível do que poderiam imaginar, tirar vidas é muito mais repugnante do que gostariam e a esperança é algo ínfimo.
A história se mostra inteligente em muitas partes, pegando o leitor totalmente desprevenido. Ainda que tenhamos nossas próprias hipóteses, todo o emaranhado de poder, corrupção e desumanidade acabam por nos surpreender. É um enredo, por vezes, difícil de ser lido, devido à violência e à frieza que acompanham os personagens encarregados de matar. E a morte, aqui, é um grande jogo. O leitor se vê indignado e impotente em muitas cenas, especialmente nas que carregam no prazer da crueldade.
"A natureza decretava que nascer era uma sentença de morte e então promovia essa morte com uma coerência perversa. Nós mudamos isso. Agora somos uma força maior do que a natureza", p. 208 |
Ainda que haja bastante coerência nessa nova sociedade, percebi algumas contradições. Coisas que eram ditas em determinado momento, por vezes, eram desmentidas páginas depois em outras circunstâncias. Mesmo assim, os sentimentos que jorram no decorrer da leitura proporciona um amor positivo pelo livro. Todas as subtramas e novas revelações cativam de diversas formas. As personagens nos são apresentadas como pessoas: revelam humanidade e desumanidade, de acordo com suas experiências.
A atmosfera literária é tensa e árdua. A suavização da violência e da crueldade não acontece, o que tem efeitos positivos, a meu ver. O Ceifador desvela não uma sociedade futura, mas a sociedade atual - em termos, às vezes, metafóricos. E é por isso que a leitura é muito rica. Ela nos oferece a humanidade no seu potencial mais assustador e real, o que não deixa de ser incrível.
Love, Nina :)
Oi Nina tudo bem,
ResponderExcluirEu ando louca pra fazer essa leitura, mas creio que irá demorar até que eu tenha a possibilidade, a sua resenha me deixou mais ansiosa do que eu já estava pra fazer essa leitura, simplesmente amei, tudo o que vc mencionou despertou demais o meu interesse.
Beijoos
Olá Nina, tudo bem?
ResponderExcluirEu acabei me rendendo e comprei na Saraiva por um preço até que salgado, mas como não abaixa em lugar nenhum, foi o jeito. Eu amo distopias desde que li a trilogia da Tahereh Mafi (amor eterno por essa mulher), então não podia perder a oportunidade. Além do mais porque o Neal já está publicando uma série assim também pela Novo Conceito (e eu to doida com ela tbm), então já viu.
Não li muitos detalhes de sua resenha, pois estava com medo de acabar encontrando alguma coisa que não gostaria de ver, rs, mas volto para dizer o que achei.
Beijos
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirNão sei se o puxaria da estante de uma livraria pela capa, mas essa sinopse... Realmente... Só um GIF de aplausos pode descrever.
ResponderExcluirAs citações que usou são incríveis, ideais para um livro que tem morte e imortalidade de forma recorrente, temas que sempre há algo sobre o que pensar, carregam uma profundidade. Preciso ler.
E bateu saudades do personagem de mesmo nome em Trono de Vidro, Rowan, quando li.
Dragões em Júpiter
Quando eu vi a capa pela primeira vez, também não me animei para ler kkkk Mas aí eu vi algumas resenhas e comecei a me interessar. Eu gostei de ver a sua opinião sobre o livro e espero que se eu for ler, que eu goste da leitura.
ResponderExcluirOi Nina. Essa é a segunda resenha que leio sobre O Ceifador e ela é tão elogiosa quanto à primeira. Amo distopias e ver como os humanos são corruptíveis, em qualquer sociedade a que pertençam, é triste. Fiquei morrendo de ler e creio que o farei assim que as sequências forem lançadas. Odeia a espera por lançamentos quando estou faminta por respostas.
ResponderExcluirAh, amei a forma como escreveu sua resenha. Parabéns, você tem o dom.
Beijos
Hey!
ResponderExcluirÉ a quinta vez que leio uma resenha sobre esse livro, ele tem feito muito sucesso e a cada resenha que leio percebo uma reação diferente no leitor, fiquei bem mais curiosa para ler a obra depois da sua, gosto muito de distopias, são meu gênero favorito, não vejo a hora de poder ler a obra.
Beijos.
AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH eu quero, necessito, preciso ler esse livro pra ontem <3 Amo distopias, e cada vez que vejo mais uma resenha positiva, só fico com mais vontade ainda. Adorei as suas palavras e leia mais distopias, você vai adorar <3
ResponderExcluirBeijos,
diariasleituras.blogspot.com.br
Oiee, também recebi o livro da editora e não esperava muita coisa pela capa, mas ainda não comecei a ler, sua resenha me deixou ainda mais curiosa!
ResponderExcluirBjs
http://www.leituraentreamigas.com.br/
Olá, tudo bem?
ResponderExcluirEu achei a capa bem legal, me fascina. Outra coisa, a premissa é interessante, sempre gostei de distopias, então pode imaginar minha vontade em ler esse livro. Gostei da sua resenha, clara e objetiva. Parabéns e dica anotada!
Olá Nina, tudo bem?
ResponderExcluirEu não sei porque, mas essa capa realmente chamou a minha atenção. A sua é a primeira resenha que leio dessa obra e só pela capa e sinopse eu já leria, e tudo ficou ainda mais confirmado depois de ler as suas impressões. Espero conseguir passar por cima das contradições que você indicou para que eu possa ter uma leitura tão agradável quanto você.
Beijos