Só garotos: juventude, arte e amor
Sabe quando você revisita um lugar que ama, mas que fazia tempo que não olhava? Foi essa sensação que percebi que senti durante toda a leitura de Só garotos, da Patti Smith. Eu tenho me apaixonado cada vez mais por autobiografias e ter lido esse livro foi como ler A arte de pedir, da maravilhosa Amanda Palmer, pois re-senti todos os sentimentos de êxtase e de paixão.
Título original: Just kids
Autora: Patti Smith
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 272
Ano: 2006 (EUA) | 2015 (BR)
★★★★★ + ❤
Patti inicia o livro com seu nascimento, em 1946. Conta sobre sua infância com o irmão e como, desde pequena, sempre admirou a arte. Ainda criança, lá estava ela lendo. E foi por causa da literatura, mais especificamente por causa do poeta francês Arthur Rimbaud, que ela se enveredou pela poesia.
Eu não tinha nenhum conhecimento prévio da Patti, além do fato de que ela era uma artista famosa. E, por isso mesmo ler Só garotos foi sensacional. Achei incrível descobrir coisas sobre a vida dela, seus pensamentos e seus sentimentos criativos. Eu não sabia, por exemplo, que aos 20 anos ela ficou grávida. No entanto, acabou doando a criança, por não ter condições de criar. Eu não pretendo ser mãe e confesso que não entendo a emoção materna, mas fiquei imaginando quão difícil deve ter sido fazer isso, especialmente num tempo em que as famílias ainda eram tão tradicionais.
Após a gravidez, Patti se mudou para Nova York. O início foi difícil, sem emprego e sem saber para onde ir, mas aos poucos a vida ofereceu boas alternativas, especialmente porque ela pôde conhecer pessoas que a ajudaram. Uma dessas pessoas foi Robert Mapplethorpe.
Ele estava à procura, consciente ou inconscientemente, de si mesmo. Estava em um estado vivo de transformação. p. 52
Só garotos fala sobre a vida de Patti, mas é impossível falar de sua vida sem falar da vida de Robert, pois eles estiveram juntos por mais de 20 anos. O amor deles teve diversas fases, iniciou no romance, mas terminou na amizade profunda. Isso porque, ao longo dos anos, Robert se percebeu homossexual, no entanto não houve ruptura no relacionamento deles. Apesar de romântica e sexualmente a relação não ser mais a mesma, a amizade perdurou até o final.
O que mais senti durante a leitura foi que eu estava acompanhando a vida de Robert, não de Patti. É assim que parece, pois é o que ela quer passar: quão importante ele foi para ela. E perceber isso foi muito especial e emocionante. Sobre Robert: me senti muito triste por ler o quanto ele reprimia a sexualidade dele. A própria Patti diz que não entendia nada de homossexualidade e que achava que não o estava apoiando tanto quanto gostaria.
Assim como a relação de Patti com Robert, as artes de ambos foram se moldando, se descobrindo, acima de tudo, encontrando espaço na vida um do outro. É muito lindo e inspirador como eles se apoiavam, se incentivavam e uniam suas artes. Ela com a poesia, ele com a fotografia. Não a toa, ele tirou a maior parte das fotos importantes de Patti, desde capas de seus livros, até fotografias de família, quando ela já estava casada e com filhos.
"O que vai acontecer com a gente?", perguntei. "A gente sempre vai existir", ele respondeu. p. 138
A sensação que eu tive durante a leitura foi começar amar alguém. Eu quis demais conhecer qualquer pedacinho da vida de Patti, senti como se estivesse entrando num lago muito confortável, até porque a própria Patti parece uma artista muito suave e doce. Apesar de seus surtos de criatividade profundos e de suas músicas serem do gênero punk, as palavras e os sentimentos dela me pareceram muito suaves e sensíveis. Ela não é o esterótipo da artista drogada e desmedida. Patti se expressa através de sua arte com cuidado e esmero.
Uma das coisas que mais gostei, com certeza, foi ler sobre as épocas culturais em que ela foi vivendo, a que mais me deixou curiosa foi a sub-cultura beatnik. Foi muito incrível ler os relatos dela, porque me pareceu que era uma pessoa comum no meio de um monte de artistas importantes, como Janis Joplin e Jimi Hendrix.
Apesar das dificuldades de Nova York, como quase passar fome, dá pra entender o quanto tudo isso foi muito importante para ela, pois pôde construir e moldar quem ela gostaria de se tornar e o que gostaria de tornar a sua arte.
Uma coisa engraçada sobre o título é que eu imaginei outro sentido para ele, antes de entender o porquê da tradução Achei que tivesse sentido de "apenas garotos são permitidos", mas o sentido original é de "são apenas crianças/jovens". Achei muito legal essa minha confusão, até porque me ajudou a construir mais a obra e seu significado para mim.
Eu não gostei da capa, preciso dizer isso. O efeito metálico, pra mim, ficou muito de mau gosto. Ainda assim, a imagem não ficou pixelada ou de má qualidade. Se o efeito fosse diferente, eu teria curtido mais. A edição da TAG Livros ficou muito melhor e mais criativa.
Apesar da capa, todo o resto é apaixonante. O livro, aliás, combina texto com imagens pessoais de Patti, que dão um toque ainda mais intimista e próximo. Eu adorei as fotografias em branco e preto, pois me senti muito na época retratada, que termina em 1886, quando Robert faleceU devido à AIDS.
Impossível dizer menos de uma obra tão maravilhosa. Amei demais começar a conhecer a Patti e espero continuar amando-a com Linha M.
Ele havia sido criticado por negar sua homossexualidade; nós éramos acusados de não sermos um casal de verdade. Ele temia que nossa relação fosse destruída ao abrir o jogo sobre sua homossexualidade. Precisávamos de tempo para descobrir o que tudo aquilo significava, como faríamos para nos ajustar e redefinir o modo de chamar nosso amor. Aprendi com ele que muitas vezes a contradição é o caminho mais claro para a verdade. p. 185
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A leitura de Só garotos aconteceu por causa da minha meta do Leia Mulheres de 2018. Conheça as outras obras escolhidas e lidas AQUI :)
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Conheça mais sobre a Patti Smith AQUI e AQUI.
Eu estou escutando demais o cover da Patti de Smell Like Teen Spirit, vem ouvir também!
Eu estou escutando demais o cover da Patti de Smell Like Teen Spirit, vem ouvir também!
Love, Nina :)
Li recentemente... lindíssimo! Já vi Patti Smith ao vivo, ela é incrível!
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