Amor por direito: uma história feliz para poucos

junho 05, 2017
Ando percebendo que a temática LGBT está bastante distante de mim, especialmente por causa do TCC. Em 2017, o único livro que li do nicho foi O próximo da lista, apesar de estar acompanhando Relicário no Wattpad. Ainda assim, acho que estou fazendo muito pouco (quase nada) para quem ama histórias LGBT's. 

Amor por direito era um filme que estava na minha lista para ser visto desde que soube do lançamento, então, aproveitei que ia passar na TV aberta, numa dessas madrugadas, e assisti. 

Título original: Freeheld
Diretor: Peter Sollet
Duração: 1h44
Gênero: Drama
Ano: 2015 (EUA) | 2016 (BR)
★★★★

Baseado em uma história real, o filme é não é focado no amor como um sentimento livre, mas nas consequências jurídicas do amor: nos direitos legais e constitucionais destinados à comunidade LGBT. Por ser ambientado em um condado dos Estados Unidos, a constituição e os procedimentos jurídicos são completamente diferentes dos brasileiros. Lá, eles têm lógicas políticas muito específicas, mas que não influenciam o entendimento do enredo. 

Laurel (Juliane Moore) é servidora pública, atuando como policial. Desde o início, o espectador já percebe que ela é bastante prestigiada e sua carreira é calcada na rigidez, disciplina e justiça. É numa aula de vôlei, em outra cidade, que conhece Stacie (Ellen Page). A diferença de idade entre elas não impede que Stacie demonstre interesse por Laurel. Por outro lado, Laurel, mais preocupada com suas funções profissionais, não dá muito a entender que leva o interesse da outra a sério. Mas elas acabam saindo juntas em uma noite, que determina o início da relação amorosa. Esse início é muito corrido, não deixa brecha para a subjetividade, para o encantamento e para qualquer abertura sobre o amor. Isso me incomodou um pouco, porque as cenas pareceram jogadas na tela, ausentes de continuidade sentimental e de envolvimento emocional. 

Mas, passadas essas cenas iniciais, percebemos que o enfoque não é exatamente o do amor, como escrevi acima. Apesar de a história ser real e de se falar - de forma, a meu ver, mecânica - sobre o amor, o conflito do filme não é o sentimento em si, mas as consequências constitucionais dele. Isso porque, Laurel e Stacie concordam em morar juntas e assinar a união estável - no entanto, nada disso lhes dá poder sobre questões legais. Quando Laurel se descobre com câncer, percebem que o que elas têm de enfrentar é muito mais do que repressão social: é governamental. O tipo de câncer da personagem é incurável, o que significa que ela vai morrer. Sabendo disso, Laurel quer deixar seus bens para Stacie, assim como uma pensão - que, dentro de um casamento heteronormativo, é possível legalmente, sem restrições. Mas, como elas sequer tinham o direito de serem reconhecidas como cônjuges (pois união estável não é equivalente ao matrimônio), não havia possibilidades de os desejos de Laurel se concretizassem. 

Para que esses direitos fossem conquistados, o Conselho local deveria aprovar tal pedido, no entanto, o tradicionalismo impera de forma não somente lesbofóbica como machista (todos do Conselho são homens, que fazem pouco caso da relação das duas mulheres). É a partir daí que todo o conflito se inicia, entre protestos, aparições públicas e lesbofobia. 

— Stacie Andrew é uma mulher, certo?
— É isso mesmo.
— Eu só estou tentando entender o fato de ela [Laurel] ser lésbica.
— Por quê?
— Ela não parece lésbica.
O filme foi lançado em 2015, mas a história narrada é mostrada antes dos direitos da comunidade LGBT entrar nas pautas sociais e políticas. Então, hoje em dia assistir algo assim ainda é algo bem doloroso, porque as revindicações são puramente de direitos humanos - puramente básicos, destinados como privilégios para a comunidade heteronormativa. 

Algo interessante - e que me incomodou durante o filme - foi Laurel dizer muitas vezes que seu pedido não era por casamento, mas por igualdade - obviamente, sem perceber que a "igualdade" não aconteceria sem o mecanismo legal do casamento. Além disso, a palavra igualdade é algo que também não gosto. Quando você diz que quer ser igual ao outro, você se esquece que você é diferente do outro. E é importante lembrar que ser diferente não é, de modo algum, ser desigual do outro. E é por isso que entendo cada vez mais a revindicação por equidade, cujo sentido é bem mais real: é o de justiça plena; você vai receber aquilo que é justo. E a justiça não é privilégio. 

O longa não se preocupa muito em construir as personagens, pois a sensação é que não precisa haver arcos narrativos sobre elas; Laurel e Stacie não precisam desenvolver suas emoções ou lidar com suas orientações sexuais. Ambas sabem o que querem e o que são. Não dá para dizer qual das duas é mais auto-confiante em relação a essas questões. Ainda assim, as características das personagens são bastante delimitadas: são proporcionalmente opostas, mas sem que isso crie empecilhos (ao menos, diante das câmeras). 

Durante o embate jurídico, a parte humana também acontece. Os colegas de profissão de Laurel, aos poucos, se unem a ela. O parceiro dela, que no início, teve uma reação ridícula ao saber que ela era lésbica, é o motor para que muito da mudança aconteça. No meio do caminho, homossexuais de outras partes da comunidade começam a pressionar o Conselho, também - apesar de estarem a favor de seus próprio interesses (o casamento igualitário), a causa acaba ajudando muito a revindicação de Laurel. No plano de fundo, vemos a família de Stacie prestar apoio a elas, o que é algo bastante sutil, mas que dá aquele conforto pro coração. 

Pelo fato de o filme ser baseado em uma história real, o sentimento que me perpassou a todo momento foi o de injustiça. Toda mudança é difícil, eu sei, mas no caso de direitos humanos eu me pergunto por que é tão difícil. E por que certas pessoas veem as outras como "ladras de direitos". Se os direitos deveriam se estender a todos, como alguém pode roubar algo que deveria ser seu desde sempre? 

///

NO MUNDO REAL:

Nos Estados Unidos: somente sete anos após a morte de Laurel (em 2013), é que New Jersey começou a emitir certidões de casamento para pessoas do mesmo sexo e, em 2015, a Suprema Corte dos Estados Unidos determinou que todos os americanos têm direito ao casamento. 

No Brasil: desde 2013, o Conselho Nacional de Justiça já obriga os cartórios a celebrar o casamento civil e converter a união estável homoafetiva em casamento. 





Love, Nina :)

12 comentários:

  1. Não costumo me dedicar a leituras do gênero. Mais pelo fato de achar que muitos autores sempre batem na mesma tecla. Referente ao filme, achei uma boa opção, ainda não conhecia e vou reserva um tempo para conferir sua dica.
    Bjim!
    Tammy

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  2. Não conhecia o filme.
    Apesar de os direitos já serem iguais para todos, mudar a sociedade e a mentalidade das pessoas demora anos. Temos que dar tempo ao tempo infelizmente

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  3. Nina e mais uma vez você traz uma dica maravilhosa de filme, esse eu não conhecia e me encantada, principalmente por abordar esse assunto que até hoje a sociedade é muito preconceituosa, dica anotada com toda certeza.
    Beijinhos

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  4. Não conheço o filme.
    Mas taí uma temática que gosto de acompanhar.
    Valeu a dica!
    Bjs

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  5. Olá!! :)

    Eu confesso que não conhecia este filme mas também não senti grande curiosidade acerca deleou vontade de assistir!

    De qualquer das formas, acho ótimo que tenhas gostado e que tenhas feito essa comparação com os factos reais!

    Boas leituras!! ;)
    no-conforto-dos-livros.webnode.com

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  6. Olá, ainda não conhecia esse filme, mas após o seu post certamente assistirei quando puder. A temática é super interessante e real, como você disse, pela luta por direitos super merecidos, mas que por causa do preconceito de alguns ainda não estão ao acesso de todos em alguns lugares.

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  7. Olá! Nunca li uma história LGBT's, não que eu me lembre. Não por preconceito, apenas não é uma leitura que me desperta interesse, mas que sabe um dia. Você que gosta, que pena que está se sentindo distante de ler esse nicho. Bom que apesar da diferença de ler e politica, não atrapalha o entendimento do filme. Acho bem interessante ler ou assistir história reais. Realmente sua reflexão é verdadeira: "Se os direitos deveriam se estender a todos, como alguém pode roubar algo que deveria ser seu desde sempre?". Tomara que um dia todos tenha os direitos respeitados não apenas na lei como também no meio da sociedade. Beijos'

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  8. Olá, tudo bem?

    Confesso que não conhecia esse filme e infelizmente o mesmo não me despertou atenção ou curiosidade. O ponto positivo fica pela atriz, Juliane Moore que é muito competente e tem ótimos filmes na carreira. Todos tem o direito de ser feliz e amar!
    Beijos

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  9. Olá,

    Já li coisas LGBT e até assistir filmes com personagens secundários, mas um filme inteiramente dedicado a isso nunca assisti. Achei muito legal essa indicação, porque além de me fazer sair da minha zona de conforto, é um filme que pretende mexer bastante com o meu modo de pensar, gosto bastante quando isso acontece. Já anotei a dica e espero assisti-lo logo. Filme baseado em fatos são muito tocantes em sua maioria, torço para que seja assim com esse filme também.

    Beijos,
    entreoculoselivros.blogspot.com

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  10. Que super resenha! Eu amo um bom filme de drama. Nem que eu não chore ou coisa do tipo, mas amo esse gênero. Vou assistir o mais rápido possível para voltar aqui e dizer o que achei.

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  11. Olá.
    Nunca li nenhum livro do gênero.
    Não conhecia o filme, parece ser um filme interessante, mas não sei se é o tipo que eu curto.
    Acho que respeito acima de tudo, todos tem direito a ter sua opinião de achar se é ou não certo, mas acima de tudo respeito.

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  12. Oi!!
    Não conhecia o filme e gostei, parece ser bem interessante.
    E concordo que igualdade não é justiça!

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Olá, obrigada pelo comentário, mas, para evitar passar vergonha na internet, por favor, não seja machista, LGBTQAfóbico(a), ou racista. O mundo agradece :)

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