Confissões on-line: a vida além do que se mostra

Eu sigo a Iris Figueiredo há algum tempo no Twitter e ainda não tinha tido a oportunidade de ler sua literatura. Confissões on-line é o primeiro de uma duologia, já publicado há algum tempinho (2011, pela Amazon; 2014, pela Generale). Aproveitei que, esses dias, ele estava bem baratinho na Amazon e corri para comprar,


Título: Confissões on-line - Bastidores da minha vida virtual
Autora: Iris Figueiredo
Editora: Évora - selo Generale
Páginas: 229
Ano: 2014
★★★★ +

Para quem gosta de literatura juvenil nacional, é provável que vá aprovar o livro. Eu sou a louca dos YA's, de maneira geral, e gosto muito de ler a nossa literatura juvenil, pois, apesar de ficção, há muito como aprender sobre a nossa cultura e perceber que um bom livro para adolescentes não precisa vir do exterior. 

A narrativa de Confissões on-line é corrida, e esse é um dos pontos principais que me chama atenção na nossa literatura YA. A protagonista, Mariana, tem 17 anos e vários problemas ainda não resolvidos, assim como segredos dolorosos sobre episódios específicos de sua vida. Para tentar dar vasão à realidade que ainda a machuca, ela cria um canal no Youtube para falar sobre a vida - literalmente, sobre qualquer coisa: a escola, a família, as loucuras do dia a dia. 

Na escola, a menina tem que lidar com ex-amigas que lhe viraram as costas e que traíram sua confiança. Ficamos sabendo que ela namorava e que seu ex também está contra ela. A princípio, fiquei muito curiosa para saber sobre o passado de Mariana, pois ela o menciona toda hora, mas a verdade demora muito para ser revelada ao leitor. Depois de um tempo, esse "suspense" começou a me irritar, apesar de ser bastante fácil inferir, em parte, o que aconteceu entre ela, seu ex-namorado e seu ex-melhor amiga. Ainda assim, esse peso que a personagem carrega ao longo da história também serve para gerar muita empatia por ela, pois o sofrimento dela - na maior parte do tempo calado - acaba afligindo angústia também no leitor. 

Mariana está no final da adolescência, mas eu li muita imaturidade. Apesar de muitos outros personagens afirmarem que ela era "muito mais madura do que aparentava", eu não notei isso, pelo contrário: ela protagoniza muitas cenas mesquinhas, inconsequentes e bobas. O sofrimento que ela arrasta em silêncio, por exemplo, é algo que me irritou muito, pois diversas vezes as pessoas quiseram se desculpar, conversar e compreender sua situação e ela agia como uma criança de cinco anos, afastando e gritando com todos. Eu entendo que, quando estamos com um problema que ainda não sabemos como lidar, temos a tendência de acreditar que estamos sozinhos, que essa dor é só nossa e que ninguém irá entender, mas o comportamento de Mariana apenas dá a impressão de que ela quer muito empatia dos outros, mas não sabe ser empática com ninguém. 

"Milhares de vezes me peguei pensando como seria se um ou outro detalhe fosse diferente. Eu acreditava que cada escolha que fazia ou deixava de fazer abria uma porta e fechava outra mil, e a chave capaz de abrir cada uma dessas portas que ficaram para trás se perdera para sempre. Não dava para voltar e consertar os erros do passado, mas era possível mudar o presente a cada dia, tentando fazer melhores escolhas e quem sabe um dia estar satisfeita com elas", p. 178

Mas temos pontos positivos em outros plots, como a família e a melhor amiga, a Carina. A família de Mari é composta pela mãe (muito, muito presente), a irmã mais velha (também bastante presente, mas quase sempre menosprezada por Mariana) e o pai (que aparece com pouca frequência). E ela existe o tempo todo. Existem diálogos reais com os pais, com a irmã e com todos que fazem parte do âmbito familiar. É fácil perceber, também, que esse núcleo tem um espaço grande em sua vida. E é aquela típica família brasileira que gostamos e que sabemos o que esperar (de um jeito bom). 

A melhor amiga, Carina (ou Nina), é um plot que adorei ler. Fico muito feliz quando os autores entendem que a literatura é muito mais do que uma história e que pode ser usada para promover debates, disseminar informações e lembrar que a nossa realidade não é única. Carina, conforme vamos lendo a história, se revela ter um transtorno alimentar muito severo, que é constantemente abordado. As cenas são repetitivas, de começo, mas creio que foram uma ótima forma para começarmos a perceber como é que se dá a dinâmica do transtorno. A autora conseguiu delinear o assunto - e o debate - muito bem, mas o final ficou a desejar, pois parece que fica "por isso mesmo", não há um real fechamento (mas o volume II, provavelmente, continua o assunto e traz um depois do qual senti falta neste volume). 

O livro também aborda o romance, já que isso é típico em história juvenis. Não tenho muito o que falar dessa parte, pois, apesar de ter gostado do parzinho de Mariana, não me apeguei a ele, nem shipei tanto assim. Pelo fato de haver muitos, muitos assuntos descritos de uma só vez, a narrativa entra num ritmo acelerado e, às vezes, você até se perde com o que aconteceu antes (rs). Não que isso seja algo ruim, já que esse ritmo funcionou muito bem para mim. Mas fico me perguntando, como li nessa newsletter há bastante tempo, se essa aceleração constante e enredos surpreendentes não defasam algo que é absolutamente normal: a falta de ansiedade, a falta do sentir adoidado. A minha adolescência foi absolutamente parada, por exemplo, tanto por causa da minha introversão, tanto pelo fato de eu não ter necessidade alguma em sentir em demasia (e eu gosto muito de lembrar dela assim, em comparação ao que vivo hoje). Também fico pensando: será que a adolescência de hoje (e de amanhã) precisa de tudo isso? 

"Eu gostaria que tivéssemos mais aulas sobre o futuro. E que existisse uma disciplina chamada 'Futurologia', para nos ensinar quais caminhos tomar, em quais pessoas confiar e como agir para nunca mais se machucar. Mas eu não preciso de nenhuma disciplina na escola para me ensinar o último tópico: para não me ferir outra vez, eu só preciso parar de correr riscos. Só que também descobri que não vale nada uma vida sem se arriscar", p. 190

Alguns pontos, como a vida virtual da personagem, ficam em planos distintos, dependendo da importância. Como o título faz menção à sua vida virtual, achei que isso apareceria bem mais - no entanto, acredito que existe um equilíbrio muito bom entre a realidade e o ambiente virtual. Um assunto que poderia ter rendido um debate, ou mesmo um plot estendido, foi o assédio, mas não foi desenvolvido. Ainda assim, há uma harmonia muito grande durante toda a leitura entre os personagens, suas histórias e seus segredos. Alguns fios poderiam ter sido desenrolados melhor, mas fico pensando que, talvez, o sejam no volume subsequente. A revisão deixa um pouco a desejar, pelos erros repetidos de pontuação - mas não chegou a me incomodar muito. 

Confissões on-line não é um típico YA. Ele entende o público com o qual conversa: os assuntos pesados não são tratados como drama, mas com visibilidade (alguns com mais, outros com menos profundidade). É muito fácil se relacionar com as situações escritas, de ir além do juvenil, pois o livro dialoga sobre coisas muito cotidianas - não é preciso ser adolescente para lê-lo e se identificar com ele. Eu, que estou prestes a me formar na faculdade, me relacionei muito com o final, por causa da formatura (do ensino médio) de Mariana. Confesso que muita coisa ficou engasgada em mim depois da leitura desse livro e que me fez perceber a minha realidade de outro modo, com muito mais importância e urgência. Acredito que falar sobre confiança, amizade e empatia é sempre um ótimo modo de levar a reflexão aos jovens e a obra cumpriu isso bastante bem. 

Love, Nina :)

13 comentários:

  1. Oi Nina, tudo bom?
    Eu gostei da resenha, mas confesso que não estou muito no clima para os romances adolescentes e um dos motivos é por a/o personagem agir de modo que não vai de encontro com a realidade, ai quando você falou como a Mariana resolveu encarrar a situação, se fechando, aguentando tudo sozinha e dando uns pitis de vez em quando desanimei. Mas, gostei de saber dessa "família brasileira" como você comparou, acho que a personagem tem muita sorte de ter uma base forte e sempre melhor para superamos um obstaculo. Não conhecia um livro, não sei se vou ler, porém nunca diga nunca, quem sabe mais para frente eu dê uma chance. Achei interessante as citações que colocou na resenha.

    Abraços,
    Camila.

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  2. Olá, tudo bem? Nossa, na primeira frase tu ja me convenceu a ler o livro, haha, pois gosto muito de Literatura nacional e juvenil, então.. com certeza eu vou ler esse livro, amei sua resenha!

    http://duaslivreiras.blogspot.com.br

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  3. Olá, gostei da sua resenha e a sua visão da história, mas YA não é muito o meu estilo de leituta, mas vou recomendar a leitura e a sua resenha para amigos que sei que curte.
    Sucesso.

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  4. Oi Nina,
    Tudo? Comprei esse livro há uns dois anos e ainda não o li acredita?Pois é, a fila é grande, mas ele está aqui e pretendo ler em breve. Eu nem imaginava que ele tratava de tantos assuntos sérios como você descreveu, achei que seria só um romance divertido mas pelo que vi temos várias questões importantes e polêmicas tratadas espero que a autora tenha conseguido se sair bem nessas.Enfim, quero ler logo que der.
    Beijos
    Raquel Machado
    Leitura Kriativa
    leiturakriativa.blogspot.com

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  5. Olá. Esse não é o tipo de livro que eu tenho costume de ler e infelizmente não me atraiu muito. Acho legal para quem gosta e especialmente para a faixa etária que ele é destinado, mas acho que não tenho mais paciência para temas escolares e tal.
    Beijos.

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  6. É sempre bom vir aqui no teu blog e admito precisar vir com mais frequência porque sinto tanta admiração pelas coisas que tu escreves! As resenhas são sempre tão ótimas, essa por exemplo, conseguiu captar tanto as informações positivas quanto negativas da tua experiência, queria saber escrever tão bem assim hahah <3 O que falar sobre o livro? Ah, eu não ando tanto na vibe YA, mas eu gosto de ler (bastante), eu me afastei dos YAs por um tempo, mas estou querendo voltar. Adorei saber que a autora tratou de temas fortes, como o transtorno alimentar, mas é uma pena que alguns pontos ficaram em aberto. Como você disse, espera-se que a autora feche esses pontinhos no próximo livro, espero que cê consiga ler e gostar! No mais, eu não li tantos nacionais do gênero e necessito, então vou guardar o nome dele para o momento certo.

    Ahhh, posso te indicar uma coisa? Não sei se você gosta desse tipo de música, mas sempre que venho aqui e leio tua bio ali do lado, eu lembro de uma música muito especial para mim. Espero que você saiba de qual parte da bio eu estou falando, quando escutar a música. Aqui: { https://www.youtube.com/watch?v=jcq5NlYz1PU }

    XOXO <3

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  7. Dou muito valor a livros nacionais, e sempre me apego muito a eles quando leio. Este tipo de livro que você trouxe a resenha costuma ser bem fluído, mas sempre espero que a história seja boa, este me deixou algumas dúvidas, então acredito que apenas lendo para saber se ele faria parte do meu clube de favoritos. Gostei de conhecer a obra e saber sua opinião sobre ela.

    Beijos.
    https://cabinedeleitura0.blogspot.com.br/

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  8. Olá! Parabéns pela resenha! Curto alguns YA, mas a premissa desse não me atraiu tanto. Acho que pelo fato da imaturidade mencionada. Curto YA com dramas mais fortes, mas quem sabe eu leia um dia, beijos!

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  9. Olá Nina!
    Que belo achado esse hein!
    Eu adoro YA principalmente pelo fato da maioria dos autores abordarem bons temas dentro dessa idade tão cheia de questionamentos.
    Fiquei com uma enorme vontade de realizar essa leitura.
    Beijos!

    Camila de Moraes

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  10. Oi Nina, gostei de sua resenha, você é bastante detalhista e mostrou uma visão ampla do livro instigando à leitura. Apesar disso não curti muito o enredo e dessa vez não lerei, mas se fosse adolescente arriscaria... Beijos

    Nara Dias
    Viagens de Papel

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  11. Não sei o que aconteceu comigo que desencantei um pouco dos Juvenis, e leio bem pouco, quase nada. Mas de vez em quando, se aparece um que aborde um tema interessante, eu leio. Mas sempre fico pegando dicas para meus conhecidos mais jovens, e adorei o fato deste ser nacional. Dica anotadíssima.

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  12. Heeey, tudo bem?
    Achei a capa uma fofura, acho que leria por este motivo de cara.
    Me decepcionei com alguns romances adolescente que li, e no momento não pretendo ler esse gênero.
    Mas vou deixar anotado e depois procuro mais a respeito.

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  13. Oie amore,

    Nossa parece ser bem interessante, bem curiosa por aqui pra ler essa maravilha.
    Dica anotada por aqui!
    Arrasou!


    Beijokas!

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Olá, obrigada pelo comentário, mas, para evitar passar vergonha na internet, por favor, não seja machista, LGBTQAfóbico(a), ou racista. O mundo agradece :)

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Editado por Alice Gonçalves . Tecnologia do Blogger.