Essential book: março

Quando eu sugeri que o tema desse mês fosse o da essência das mulheres não sabia que seria tão difícil. Provavelmente noventa por cento das leituras que faço (e já fiz na vida) foram escritas por mulheres - até aí tudo bem, mas quem diria que escolher um único livro que me fizesse brilhar os olhos sobre o assunto seria tão complicado? 

Depois de tantos temas, às vezes parece que não tenho mais muitas alternativas boas sem que precise repetir algum livro. Como eu também procuro apresentar livros que ainda não pude resenhar, às vezes eles me salvam - que foi o caso de março. 

O livro escolhido foi the princess saves herself in this one, da Amanda Lovelace. Eu o li um pouco antes de o lançamento nacional acontecer, ou seja, eu tenho a versão em inglês, o que não me arrependo nem um pouco. Eu realmente gosto muito de conhecer a língua natural das poetas, também porque a gente experencia a leitura de outro jeito, muito mais próximo. Então, eu não pretendo comprar as versões nacionais de livros poéticos de autoras internacionais. 

the princess saves herself in this one tem uma narrativa linear, apesar de o livro ser composto somente de poemas. Fica óbvio que, a partir dos versos, acompanhamos a vida real da autora - sua infância, sua adolescência, sua relação com a mãe, com os homens e consigo mesma.

Ainda que o tema do mês fale em mulheres, eu preferi me ater ao ponto de vista da protagonista, uma mulher que claramente busca aprovação da sociedade e da mãe, mas recebe bullying e rejeição, especialmente por ser gorda. "Mulheres", pois temos duas figuras femininas: a filha e a mãe.

a princesa pulou da torre e aprendeu que poderia voar por muito tempo.

- ela nunca precisou dessas asas. 

É interessante e triste notar que existe um amor abusivo entre mãe e filha - algo que a gente pouco vê ser debatido. A autora é constantemente colocada para baixo, mesmo ainda criança, e isso permeia toda a jornada de vida dela. Talvez pareça bobo dizer o quanto uma opinião alheia afeta a nossa auto-estima, porque parece que estamos na era do "eu não ligo", mas eu acredito que a gente só finge que não liga. E é por isso que a leitura desses poemas é tão introspectiva, eles se conectam com o mais humano de nós, com as coisas que nem sempre percebemos de cara e que, às vezes, vivemos negando. 

Estar confortável no seu próprio corpo é, muitas e muitas vezes, um exercício diário e que demanda muito sofrimento, não simplesmente por causa da mídia, mas porque as própria pessoas ao nosso redor não entendem as consequências de um simples comentário. 

Talvez, um dia, sejamos capazes de dizer, de fato, que não ligamos. Mas, lá no fundo, talvez essa ainda não seja a nossa realidade. Sentir-se errada o tempo inteiro dói muito - e a Amanda consegue colocar isso com muita simplicidade. 

a princesa se trancou na torre mais alta esperando que um cavaleiro

em uma armadura brilhante viesse salvá-la

- eu não percebi que poderia ser meu próprio cavaleiro.

Depois de muito ser invisibilizada e diminuída por sua mãe, a autora começa a perceber que a cura às vezes nem sempre tem a ver com o outro, mas com si mesma. A lição, de modo geral, do livro é amor-próprio e isso vai acontecendo bem aos poucos. Existe muito sofrimento psicológico antes disso, é claro, o que é bem triste. E bem real. 

A gente sempre vai sentir que as opressões diárias ferram com o nosso psicológico e, talvez, não tenha um modo de isso parar, além de buscar por um entendimento pessoal. Eu realmente desejo que a Amanda faça terapia - provavelmente toda mulher deveria ser acompanhada psicologicamente para suportar os julgamentos, as cobranças e os fracassos. 

eu me peguei entre estar de luto por você & pensar que a sua morte me salvou.

- você será capaz de me perdoar?

Esse relacionamento abusivo entre mãe e filha, felizmente, tem um desfecho feliz - mas é causado por uma tragédia familiar. É aí que percebemos que, mais do que nunca, a autora quer muito ser aceita. No entanto, se ver livre de todo o bullying materno permite que ela dê um passo à frente em sua vida. 

Não acredito que somos fortes por causa da dor, mas apesar dela. E acho que a Amanda fez exatamente isso: aprendeu mais sobre amar a si mesma em meio ao caos emocional. 

nós nunca nunca nunca nunca nos sentaremos na varanda dos fundos e nunca nunca nunca mais trocaremos histórias de fantasmas por canecas fumegantes de café.

Depois de tanta angústia e diminuição, acontece a libertação com uma surpresa: a autora relembra momentos bons com a mãe, demonstrando que, mesmo que todas as coisas negativas ainda doam, existe tristeza e saudade nela. 

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I. O tema de fevereiro foi

a essência da alegria

e você pode conferi-lo AQUI.

II. Leia mais sobre a relação mãe e filha deste livro

nesse texto 

que escrevi para a Revista Pólen.

Quote do livro "Profissões para mulheres e outros artigos feministas", de Virginia Woolf.

Love, Nina :)