Entrevista: Negritude & Literatura

Para continuar as postagens mensais de entrevista, elegi o dia da consciência negra (20/11) como o tema do mês no blog :)


Fiquei muito feliz por tudo ter dado tão certo, aliás. Quando pensei sobre a temática, não sabia como encontrar uma autora negra, até porque não tenho referências próximas. Mas aconteceu a Feira do Livro de Porto Alegre e, casualmente, acabei lendo uma matéria sobre uma coletânea que tinha sido ancorada por somente pessoas negras, chamada "Negras Palavras Gaúchas 2", que saiu pela Câmara do Livro daqui. Meu segundo desafio foi encontrar o livro no meio da Feira. Acabou que consegui que a Câmara me doasse um dos exemplares, já que ele não pode ser vendido. Me senti muito feliz e muito próxima, aliás, da minha profissão, que é o jornalismo (essa coisa toda de ir atrás incansavelmente das informações).

Bom, antologia conseguida, lá fui eu atrás de possíveis fontes. Cheguei ao número de três, mas apenas a Luciane Chagas Dias me respondeu. A Luciane é professora, formada em História e em Pedagogia, atuando nas séries finais do Ensino Fundamental e como oficineira de Artes, Dança, Teatro e História e Cultura Afrobrasileira. Na coletânea, tem uma crônica sobre o orgulho da pele negra.


Você acredita que o espaço concedido às pessoas negras na literatura ainda é estereotipado, no caso de personagens, ou ainda muito condicionado, no caso de autores? 
O espaço concedido é muito pouco ou quase nada, são poucas as editoras que se interessam pelas histórias e pelos escritores negros... A proposta desta temática conscientiza a importância e contribuição da mulher negra em todas as esferas da sociedade e, principalmente, na construção do nosso país. A figura  da Mãe Preta deve sair do imaginário popular como submissa para o concreto: ela existiu com seus anseios, sonhos, preocupações e a sua resistência, passados para as futuras gerações. 


A Angela Davis escreveu "Mulheres, raça e classe". Para você, qual importância da interseccionalidade na temática racial?
A lei 10.639/03 torna obrigatório o Ensino de Historia Cultura Afrobrasileira nos currículos escolares, os livros didáticos também falam sobre o tema do negro sobre a escravidão, porém existe uma limitação sobre o que abordar, caindo sempre na mesma falácia sobre a questão do racismo, do preconceito etc... Quem foi, quem fez e que resultou... Para abordar temas diferenciados, como a mulher negra depende da boa vontade do professor em pesquisar e firmar a temática em sala de aula. Acredito que a interseccionalidade aproxima as intenções da lei 10.639/03 na visibilidade e importância da mulher negra. 

Quais estereótipos você gostaria que não mais fossem escritos sobre as pessoas negras e, mais especificamente, sobre as mulheres negras? 
Não gostaria de ver representados negros como pobres, favelados, marginais
vingativos, com desvios de conduta. Sobre as mulheres negras, não gostaria de ler ou ver  a erotização: por ser negra tem que ser fogosa, barraqueira, leviana, invejosa, vingativa. Mostrar atitudes reais que qualquer mulher teria independente da cor.

O que o texto que você escreveu para "Negras palavras gaúchas 2" tem a acrescentar aos leitores? De onde surgiu a necessidade de escrevê-lo? 
Já era um sonho, quando li a primeira edição do Negras Palavras Gaúchas, que tenho um exemplar. Achei legal a iniciativa, li várias vezes, me empolguei, mas não imaginava ser autora. Foi incrível,que Deus abençoe sempre o Oscar [organizador da coletânea] pela oportunidade. Quanto ao texto gostaria de compartilhar com os leitores sobre o porquê da escravidão. Ela foi, sim, consentida, embasada e justificada em termos religiosos. Não tenho intenção de romper com a religião. Fé não se discute. Essa linha de pensamento aliada a interesses econômicos, sejam africanos ou europeus, acabou com a vida de milhões de pessoas. Ainda há muito a pesquisar e a descobrir, mas acredito que tenha acrescentado a quem tiver interesse pelo assunto. Espero que leiam, gostem ou critiquem. O importante é compartilhar conhecimentos.

Você tem indicações de livros ficcionais e não-ficcionais que falem sobre o racismo ou que sejam centrados em personagens negras?
Um que eu li na faculdade, indicado pelo meu professor Alexandre Magnus, que viu meu interesse sobre  temática das mulheres negras, foi Pretas de Honra, lançado pelo também professor e escritor Maciel Carneiro, que fez a sua dissertação de mestrado pela Ufba sobre o tema. Esse livro foi muito importante na minha consolidação da importância da mulher negra na sociedade brasileira. Veio ao encontro das minhas ideias sobre o tema.

~

Confira AQUI a postagem anterior da programação #racismonão

~

Leia AQUI as entrevistas de setembro e de outubro :)

Love, Nina :)

11 comentários:

  1. Amei demais essa entrevista!!!
    E a pergunta sobre esteriótipos me deixou com o coração na mão pq é verdade e real.
    Ontem li um artigo em que a Policia Militar não gostou de uma tirinha feita (caso não tenha visto, vale a pena pesquisar a resposta do autor) em que o autor deixou claro que não é seguro para uma criança negra correr.. A PM não gostou e quis censurar o ilustrador e autor. Infelizmente na literatura ou em outras mídias isso é muito comum.. São sempre vistos de forma marginalizadas, sendo que temos tanto pra aprender da cultura.. =/

    ResponderExcluir
  2. Olá Nina!
    Amei a temática e a entrevista, Parabéns!
    Confesso que fiquei curiosa em ler a antologia.
    Gostei da indicação de livro feita pela Luciane, "Pretas de honra ", vou adicionar a minha lista.
    Beijo

    ResponderExcluir
  3. Olá, Nina!
    Eu não conhecia a Luciane e adorei poder conferir a sua entrevista com ela, inclusive já anotei o livro que ela indicou porque me interessei bastante por ele e espero poder ler em breve.
    Infelizmente cada um dos esteriótipos que ela citou são tão recorrentes em livros, filmes e novelas, negros são sempre os empregados dos patrões brancos e ricos e sendo a empregada vai ter um caso com o patrão. O pobre morador de comunidades é ladrão. Não aguento mais ver/ler esse tipo de coisa e me entristeço por isso.

    ResponderExcluir
  4. Olá Nina, tudo bem? Menina, que entrevista maravilhosa!
    Eu tenho uma coluna de entrevistas no meu blog mas, nenhuma delas foi tão inspiradora quanto essa que você postou, gostei muito de todas as perguntas que elaborou, as respostas também ficaram ótimas. Estou anotando aqui o nome do livro que ela indicou, espero conseguir realizar a leitura dele no inicio do ano que vem, tenho uma seleção de livros de autoras negras que pretendo ler no ano que vem.

    Beijos e Abraços Vivi
    Resenhas da Viviane

    ResponderExcluir
  5. Olá, tudo bem Nina?

    Parabéns pela entrevista, gostei muito e ficou bem elaborada. Eu por vezes realizo algumas entrevistas também, é uma forma de dar visibilidade e incentivar a leitura. Eu não conhecia a Luciane e gostei do que li, pois realmente os esteriótipos por ela citada são recorrentes.
    Abraço!

    ResponderExcluir
  6. Gostei muito da entrevista e de todo seu esforço para consegui-la. Infelizmente tudo que a Luciane respondeu é uma realidade que eu percebo nos livros que leio, quando aparece um personagem negro ele é totalmente estereotipado e concordo que deveriam mostrar atitudes reais independente da cor. Claro que eu não conhecia o livro Petras de Honra, mas quero muito ler e conferir toda importancia da mulher negra na sociedade brasileira.
    Abraços.
    https://acabinedeleitura.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  7. Oi Nina, eu adoro estas entrevistas, percebemos que escritores são pessoas comuns como nós. Já sobre o mês da consciência negra, meu filho teve palestras na escola e visitou a nossa universidade que tinha alguns eventos relacionados.
    Não sabia que tu era gaúcha, eu sou de Santa Maria.
    Bjos
    Vivi

    ResponderExcluir
  8. Oi, Nina! Adorei a iniciativa da sua entrevista e que bom que deu bons frutos! Gostei muito da entrevista, achei inspiradora e a pergunta sobre esteriótipos foi a que mais pegou. Além desses que a autora citou, acho que o da "mulata com samba no pé" também é muito recorrente (como "todo brasileiro gosta de futebol").
    Bjos
    Lucy - Por essas páginas

    ResponderExcluir
  9. Ola!!

    Uau Nina que entrevista incrivel! Não conhecia a autora, mas adorei a temática e o foco da entrevista. Não tenho lido muitos livros de autoras negras, por isso anotei a dica que ela nos passou, gostei bastante e espero ler em breve!

    Parabéns pela entrevista e novamente te falo, amo seu blog!

    beijos
    http://www.livrosetalgroup.blogspot.com.br

    ResponderExcluir
  10. Nina e seus posts lindos, sempre me conquistando! ♥
    Adorei a entrevista e, principalmente, conhecer uma nova autora. Estou tentando mudar o meu hábito de leitura e incluir mais autoras nisso, e confesso que não lembro de conhecer muitas que fossem negras. Que vergonha. Achei a sua entrevista extremamente importante e necessária. Parabéns!

    www.sonhandoatravesdepalavras.com.br

    ResponderExcluir
  11. Olá Nina, primeiramente adorei você trazer o tema para esse mês no blog, vou dar uma olhadinha nas suas outras postagens também *-*
    Ultimamente tenho prestado mais atenção nos autores que ando lendo e venho dando mais enfases nas mulheres, mas vou tentar incluir também autores negros nas minhas prioridade também *-*
    Sobre a entrevista adorei as suas perguntas, abordagem e conhecer um pouco mais da autora *-*

    ResponderExcluir

Olá, obrigada pelo comentário, mas, para evitar passar vergonha na internet, por favor, não seja machista, LGBTQAfóbico(a), ou racista. O mundo agradece :)

Qualquer preconceito exposto está sujeito à remoção.

Editado por Alice Gonçalves . Tecnologia do Blogger.